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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Semente paz

        Certa feita conversando com a amiga Liane Pinto, psicóloga, ouvi um interessante episódio sobre um encontro seu com a paz. Ela me contava que foi a um grande auditório assistir a uma palestra com certo lama tibetano.
        Liane fazia parte de uma platéia alvoroçada – com, talvez, duas mil pessoas – muito excitada para aquele evento que prometia ser bastante transformador.
      Em sua maioria, tratava-se de gente das áreas do desenvolvimento humano, espiritualidade, psicologia, ou interessados em meditação e cultura oriental.
       A princípio, diria-se que deveriam ser pessoas bastante zen.
      Ao contrário, era notável o rebuliço interior em que se encontravam. E externamente isso se refletia no comportamento, nas conversas que desenvolviam com as pessoas das poltronas ao lado e dos movimentos corporais agitados.
      No momento em que o palestrante surgiu no palco todos serenaram um pouco e fizeram silêncio. “Nossa! Quanta coisa importante sobre a paz aquele homem poderia trazer! Quantas informações valiosas ele iria oferecer!”. Provavelmente era isso que tinham em mente.
      O homem, vestido com exótico traje de cor laranja, olhou para a audiência e sorriu de forma tranqüila e doce, movimentando-se lentamente, dirigindo devagar o corpo para toda a extensão do auditório.
      E só.
      Passou um minuto sorrindo para as pessoas. O tempo passou e aquele tempo começou a parecer interminável. Entrou no segundo minuto sem dizer uma única palavra, apenas sorrindo e olhando para todos.
      E só.
     A inquietação de alguns começou quando, após perceberem que já havia se passado quase dez minutos, e o guru só fazia sorrir, ou às vezes entoar um mantra.
     Houve aqueles que começaram a se mexer nas poltronas, outros cutucaram a pessoa ao lado e comentaram algo, outros foram além e, num impulso de insatisfação ou falta de entendimento da situação, deixaram o auditório.
     Entretanto, aqueles que resistiram e ficaram, puderam saborear em cerca de trinta minutos de sorrisos, uma preleção diferente e valiosíssima sobre a paz e a sua importância no mundo que começa em nossos próprios corações, no próprio aquietamento da alma. Isso fez com que minha amiga tivesse momentos de grande tranquilidade e um genuíno encontro com a paz interior.
     É bastante fácil condenar criminosos, julgar políticos corruptos e amaldiçoar os líderes das nações em guerra. O maior desafio, contudo, será observar a violência das nossas atitudes diárias em palavras ações e pensamentos, e transformar esse estado.
      Se é tão difícil ficarmos algum tempo apenas sorrindo, em paz, ou vendo alguém fazer isso, abrindo mão momentaneamente da profusão interior de pensamentos e julgamentos, como poderemos ter a tranquila contemplação do exterior, capaz de nos deixar viver cada instante com maior tranquilidade?
      Estar em paz comigo mesmo me leva a estar em paz com o outro. E isso não tem a ver com o ambiente externo.
     O escritor e conferencista Roberto Shinyashiki costuma falar que podemos ser um “Buda no shopping center” querendo sugerir a busca do bem-estar e da paz interior mesmo que estejamos em meio a turbulências exteriores.

Série Paz-saros: gaivota na cruz em Florianópolis / Foto de Kau Mascarenhas

      Combinando perfeitamente com essa ideia, há uma antiga história que narra certa competição entre artistas que deveriam pintar um quadro sobre a paz.
       Muitos se espantaram quando viram a pintura vencedora. Era justamente aquela que trazia a imagem de um mar revolto com ondas se chocando no paredão rochoso de uma falésia.
      Certa indignação surgiu por parte dos que acompanhavam a disputa, pois lá estavam representadas diversas imagens bucólicas de flores salpicadas em veredas, montanhas emoldurando lagos azuis, campinas verdejantes, ou trigais beijados pelo vento. O que fez justamente aquela pintura com cena tão tumultuada ganhar o prêmio?
      Até que os juízes revelaram o porquê de sua escolha: na pintura do mar atormentado por furacão, com ondas poderosas açoitando o rochedo havia, de forma pouco visível, numa das pedras, um singelo ninho onde pássaros calmamente alimentavam seus filhotes. A paz pode estar num contexto de grande perturbação do ambiente exterior.
      Albert Einstein, tão conhecido pela sua devoção à ciência, era um pacifista ardoroso, e deu ao mundo importante contribuição nesse sentido.
     Não apenas dava aulas e palestras sobre física, criava fórmulas e mergulhava em pesquisas, mas redigia cartas a presidentes com teor pacifista, encabeçava manifestos pelo desarmamento e fazia conferências onde apontava caminhos para uma paz sustentável.
      Einstein fazia a sua parte, e ele era um homem muito ocupado. Cada um de nós também pode fazer algo.
     Um de seus célebres aforismos diz: “Penso 99 vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio: eis que a verdade se me revela.”
     Talvez seja esse um caminho. Plantar a semente da paz em nosso interior, aquietando a alma, entrando em calmaria emocional, pedindo licença ao pensamento.
      E ir além.
      Hoje parece não bastar que a paz seja plantada; é importante também que seja cultivada, cuidada, alimentada diariamente.
     Sejamos jardineiros da paz.
 

 

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